Memórias de uma luta por sobrevivência no deserto
No ano de 1998, uma Squaresoft dominadora do mercado de RPGs
lançou para o Sony Playstation o jogo que carregaria o seu maior e mais
elaborado enredo, Xenogears, em uma caixa com CD duplo. O game tinha todos os
quesitos acima de seus precedentes, contando com um sólido sistema de batalha
em um mundo aberto e cheio de trabalho. Quem desejasse ver o final normalmente
teria de passar por mais de 100 horas de jogo. Não que isso fosse muito quando
falamos de um título dessa qualidade.
Uma história de Deus
A história de Xenogears se passa no ano 2001. Um estranho
objeto é encontrado em um campo geológico, cientistas começam a crer que
encontraram a origem da vida na Terra. As hipóteses apresentadas em torno do
assunto geram polêmica entre todos, ainda mais quando foi comprovado que o
objeto tem mais de 4 bilhões de anos de idade, muito mais do que a idade do
planeta. Conforme o tempo passa, as grandes junções científicas falham em
descobrir qualquer coisa sobre o assunto, passando-o adiante a cientistas
amadores do projeto Zohar, que tampouco desvendam o mistério.
Cinco séculos depois, os humanos estão prontos para deixar a
Terra. O calendário é substituído, marcando a transição para a Era Transcendental
a Cristo e rebatizando nosso planeta, agora selado, para “Velha Jerusalém”. Após
vagarem a esmo no espaço por 250 anos, a tripulação finalmente encontra um
planeta com condições de vida, colonizado com o nome de “Nova Jerusalém”. A
vida parece ter encontrado o seu rumo, até que algo acontece...
O mesmo estranho objeto é encontrado em uma nave sem
tripulação, pertencente a uma seita religiosa, vinda da Velha Jerusalém. Os
trabalhos de pesquisa são então reiniciados. Um computador chamado Deus
consegue controlar a energia biológica do objeto. As coisas dão errado e Deus
assume o controle da base humana, abrindo um transporte à Velha Jerusalém. O
comandante não aceita que os humanos retornem e sai pelo espaço novamente,
separando-se de Deus, que cai na antiga Terra. Um novo ciclo de vida é iniciado
do zero no planeta, dando origem ao enredo de guerras vivenciado pelo jogador
em Xenogears.
100 horas, sem
problemas
Xenogears não se tornou um clássico à toa. A Squaresoft, em
sua melhor forma, criou uma gama de personagens altamente carismáticos para
acompanhar o jogador durante uma aventura tão enorme, ao menos para a época. O
último RPG de tanto sucesso, também da mesma softhouse, havia sido Final
Fantasy VII, grande responsável pela popularização do gênero no ocidente.
Os gráficos não eram lá grande coisa mesmo para os padrões
da época, mas para o core gamer isso
não era a coisa mais importante. A ambientação era feita num 3d pixelado e os
diálogos apresentavam os nossos velhos conhecidos personagens desenhados.
Uma característica do título que virou referência eterna no
gênero foi o seu sistema de batalha. Com personagens em 2D num tosco fundo 3D,
as batalhas eram das mais satisfatórias já vistas. Os ataques, sempre por
turno, eram desferidos mediante diferentes combinações de botões, que formavam
especiais mais fortes. Conforme ganhava experiência e subia de level, o
personagem ia ganhando (além de HP e MP) pontos de ação, que permitiam o
desencadeamento de golpes e de combos mais poderosos.
À parte de toda a ação, os diálogos obrigatórios eram sempre
extremamente longos, o que é justificado pela história mais profunda já vista
em um game. Era difícil escolher qual dos personagens era mais cativante. Todos
possuíam uma personalidade única e aprofundada, e são muitos deles. Esses
personagens já teriam conteúdo suficiente para qualquer RPG, mas há outros,
cujo nome do game menciona. Os Gears.
Os Gears
Neste game os grandes robôs chamados de Gears são um
espetáculo à parte. Cada um dos personagens jogáveis principais possui o seu
próprio Gear, que parece refletir as suas personalidades. Claro, os robôs
podiam (e tinham de) ser utilizados em batalha. Quando um
personagem possuía meros 600 pontos de HP estando em boa forma, um Gear em seus
primeiros passos tinha aproximadamente 15 mil. Partes podiam ser adquiridas em
lojas ou por outros meios para equipar e melhorar os Gears, tornando a
administração desses tão essencial para o progresso no jogo quanto os próprios
personagens.
Antigamente, as coisas eram mais difíceis. Algumas vezes,
jogadores avançados no game, com cerca de 70 horas jogadas, tinham que iniciar
tudo de novo após salvar o jogo na sala de um chefe que não estavam prontos
para enfrentar. Chefes mais poderosos que não participavam do enredo, possibilidade
de explorar o mapa mundi à vontade, tudo foi trazido para a jogabilidade, à
qual não falta absolutamente nada.
Por isso, Xenogears foi sucesso instantâneo no mundo
inteiro, para crítica e jogadores. Chegou a ser eleito o décimo sexto melhor game
de todos os tempos pelos leitores da revista nipônica Famitsu, famosa por ser a
mais exigente de todos os tempos. Após vender dois milhões de cópias no PSOne,
recebeu uma versão Greatest Hits em 2003 e foi lançado para download na PSN em
2008.
As sequências
A franquia recebeu uma trilogia de sequências para o
Playstation 2 em 2003, 2005 e 2006, produzidas pela Namco. Sob o nome de
Xenosaga, não chegaram nem perto do sucesso alcançado pelo game original,
embora sejam bons títulos. Todos são anteriores a Xenogears.em cronologia. Embora
tenham recebido em média boas críticas da imprensa, as continuações eram RPGs
bastante tradicionais em sua fórmula, porém os longos diálogos, que foram
mantidos através de toda a série, causavam tédio em jogadores já acostumados a
títulos com mais ação.
As cenas em anime continuaram (muito melhoradas) e os
personagens da trilogia são tão cativantes quanto os do original, o que torna o
título importante para fãs tradicionais do gênero. O PS2 foi um console que
ficou marcado por descaracterizar grandes séries de RPG, o que não aconteceu ao
menos com Xeno, onde as batalhas continuam sendo por turnos e a tradição foi
mantida. São horas de jogo obrigatórias para os donos de um PS2 que não tenham
medo de ler bastante e entrar de cabeça numa história profunda.
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